Pico

domingo, 18 de março de 2012

III

Duas e tantas da manhã. Acho que estou na sétima xícara de chá-mate e, apesar de só imaginar como seria, acho que ela tem gosto de água da lavagem de camuflado do exército. Por que não consigo dormir ? Por que ? Seria por causa da prova de cálculo que o professor maluco ameaçou que iria dar bomba ? Ou por causa da pergunta daquela garota ? É, eu poderia passar horas pensando nisso. Ou, poderia usar essa insônia maldita pra pensar nas misérias do mundo, em tudo de ruim e sem sentido que acontece por aí. Mas ia adiantar de alguma coisa ? Não. Sabe o ponto sobre as coisas sem sentido ? É que não importa o quanto pense, você realmente não vai achar sentido pra elas. E afinal, na dúvida sobre em qual dúvida pensar, eis que chego a uma conclusão, uma ligação nada duvidosa entre as dúvidas: não consigo dormir direito e sinceramente não imagino como poderia, porque o mundo cada vez mais se torna miséria.

II

Eu não nasci pra escrever. Ninguém nasceu. Eu, e imagino que você também, nasci sem roupa, sem vícios, sem ideologias, nasci analfabeto. Todos nascemos assim afinal, mas em nossas infâncias, se tivermos sorte, aprendemos a gostar de histórias. E nos deliciamos com a forma como elas são tecidas. Daí o que sobre é procura. Procura por novas histórias, nem melhores nem piores, apenas novas. Aí vem a necessidade de criação, e o característico perfeccionismo humano segue a edição de cada ideia criada.

sábado, 17 de março de 2012

I

 Era, certamente, como um poeta. Mas não um poeta qualquer, daqueles que falavam coisas sem sentido e eram ultrajados por tentarem transformar a poesia dos sentimentos em palavras rasgantes, sofridas. Era tudo que queria ser, quando não queria ser nada demais. Era um menino, quase homem talvez, mas ainda sim um menino. Bem verdade que era um meninão, do tipo que suava travessura, que dava um toque pessoal em todas as coisas, transformava contos de Tolkien em, no mínimo, romances Shakespeareanos. Era apaixonado por se apaixonar todos os dias, amava isso. Dava pra ver, só de olhar pra ele dava pra ver. Às vezes isso acabava no que os outros chamariam de desastre. Ele aprendera desde cedo a ser um exímio blefador, mas nunca conseguira blefar com o coração. Pra ele dava no mesmo, afinal, e era isso que o fazia tão maluco. E quando eu digo maluco, não entenda nenhuma outra coisa, entenda maluco. Ou pelo menos seria esse o diagnóstico. SE ele quisesse ser diagnosticado. Mas ele não queria. Ele não precisava. Ele só queria viver, e isso sim, era bonito de ver. Era ferido, como uma pedra lascada pelo tempo. Mas isso não o impedia de ser sensível às coisas. Isso o motivada pra vida. Ele exibia cicatrizes como apenas um pai orgulhoso mostra um filho, como um campeão exibindo aquele troféu tão difícil de conquistar. Ele tentava dar sinais o tempo todo, de tudo. Verdade que quase nunca eram interpretados como ele queria, e não era o "quase" que o motivava. Era simplesmente que ele adorava tentar.
Digamos, então, que ele não era um poeta e sim um sonhador, como todos os outros... Mas afinal, o que seria um poeta senão um incansável sonhador ?